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Por Fátima Saadi (publicado em Cadernos de Teatro nº134, pp. 2-7)
(continuação do artigo anterior) Gostaria de ressaltar que Stanislavski não via diferença no método de criação do papel quer se tratasse de comédia, drama, tragédia, ópera, etc. o que só faz reiterar o que acabamos de dizer. Stanislavski não pedia que os seus atores copiassem a aparência da vida, pelo contrário, a sua pesquisa diz sempre respeito ao que constitui a vida - e isto, parece-me, independe de estilo ou género. O que Stanislavski pede aos atores é que criem uma estrutura na qual possam crer e essa estrutura, mesmo mantendo o esquema exterior que a encenação demanda, pode ser realimentada sempre por novas imagens que o próprio ator cria ou invoca. (...) A partir das suas próprias características e das circunstâncias dadas, o ator cria o roteiro das suas acções físicas, acções simples que, executadas com rigor, servem de estímulo à imaginação. Nesse primeiro momento, a preocupação não é com a forma de veicular o personagem, mas com a opinião que o ator tem dele. O ator não se prepara para atuar, para utilizar-se de clichés que preguiçosamente se esgueiram entre ele e o seu personagem, ele se prepara para pôr-se em situação, para atualizar, em si, uma situação que, compreendida com clareza, encontrará a sua forma necessária. Daí Stanislavski adiar ao máximo o contacto do ator com o texto do autor. O trabalho do ator não provém do texto, ele é a criação de uma justificativa para aquelas situações que o texto propõe - isto é, o que se chama sub-texto. O texto tem que ser conhecido em todas as suas articulações - é dele que vêm os objetivos situacionais , mas a justificativa destes objetivos vem da imaginação do ator, da sua memória, dos seus afetos, não importa, estimulados pelo trabalho físico. Neste processo, a visualização dos detalhes imaginados é fundamental para a criação do sub-texto. O ator tem que conquistar o seu lugar na cena, assim como tem que conquistar o verbo. Evidentemente, o texto tem que ser compreendido no seu aspecto linguístico, semântico, mas não é daí que o trabalho do ator parte. Pelo contrário, Stanislavski perguntava-se sempre o que estimula o ator e o que, pelo contrário, inibe o seu trabalho criador e, conclui que, muitas vezes, o excesso de documentação sobre um personagem e a sua época acaba por estancar a criatividade do ator se a isto não se acrescentar um trabalho de combate à preguiça e aos clichés - sejam eles de que natureza forem. (...) Ao movimento geral da época que, com o surgimento do encenador, visa a voltar a cena sobre si mesma, Stanislavski acrescenta a reflexão do ator sobre o seu trabalho, fornecendo concretamente os meios para tal: um método, um caminho que entrou na história, obrigou a história a defrontar-se com uma singularidade radical. E não há nada mais difícil do que enunciar do que o singular. E é por isto que esta singularidade pode ser modulada por todos nós os que compreendemos a cena como um império para si, como um império que ajudamos a construir.
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TEATRO 16Iniciando a aventura, CITAÇÃO DO DIA
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Dezembro 2016
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